Bexiga Neurogênica

Karina Kakiuchi Trajano*


A bexiga neurogênica é a alteração da função da bexiga causada por lesões neurológicas, como a lesão do neurônio motor superior (infrasacral) e a lesão do neurônio motor inferior (suprasacral) e intracraniano.

Os sintomas podem incluir incontinência por transbordamento, frequência, urgência, incontinência e retenção da urina.

A bexiga neurogênica pode ser hiperativa, hipoativa ou mista.

Os pacientes com paraparesia espástica familiar e doenças correlatas podem ter o quadro de hiperatividade da bexiga, com urgência urinária – os primeiros sintomas relatados pelos pacientes.

 

Saiba mais sobre a bexiga

A bexiga é uma cavidade localizada na parte posterior da sínfise pubiana que funciona como um reservatório para armazenar a urina produzida nos rins. Ela é formada pelo músculo liso vesical e por três aberturas: a uretra e dois ureteres.

É a contração do músculo liso (também chamado músculo detrusor) que provoca o esvaziamento da bexiga, cuja capacidade normal de armazenamento varia de 650 a 750 ml.

Quando o volume de urina no reservatório chega a 150 ml, é transmitido um sinal para o centro de reflexo da micção na medula espinal. Assim que a inibição é abolida, os impulsos acionam o relaxamento dos esfíncteres uretrais e a contração do músculo detrusor, resultando na expulsão da urina.

Esse processo é complexo e é controlado principalmente pelo sistema nervoso.

Para determinar o melhor tratamento para cada paciente, é fundamental que se realize a anamnese, que é o recolhimento de informações a respeito de um doente e de sua doença pelo médico. Ela é fundamental para um tratamento assertivo, pois cada paciente é único no que se refere ao histórico das manifestações dos sintomas, a exemplo das condições neurológicas e sexuais; de eliminação, frequência e controle de urina; e de hematúria (eliminação anormal de células do sangue, as hemácias).

É indispensável ainda que se realize exame físico envolvendo a avaliação da musculatura pélvica, o controle dos esfíncteres e dos reflexos do assoalho pélvico e do períneo, bem como eletromiografia (biofeedback).

 

Tratamento

O tratamento precoce para todas as disfunções do trato urinário, congênitas ou adquiridas, é sempre a melhor escolha, e tem o objetivo de proteger e melhorar a função do aparelho urinário. A regulação do controle e do armazenamento urinário resulta, consequentemente, em uma melhora significativa na qualidade de vida do paciente. Assim, este é o primeiro fator a ser considerado em um tratamento, independente se for medicamentoso ou não medicamentoso. Abaixo, seguem alguns tipos de tratamento não medicamentoso.

 

Cinesioterapia: são exercícios específicos para o assoalho pélvico, como os exercícios de Kegel;

Fortalecimento do assoalho pélvico: exercícios específicos de fortalecimento da musculatura pélvica e do períneo.

Equipamentos:

  1. Laserterapia: atua no processo de regeneração, cicatrização e recuperação dos tecidos. Tem efeito anti-inflamatório, analgésico e estimulante celular;
  2. Eletroestimulação: conscientização e ativação dos músculos do assoalho pélvico por meio de aplicação de eletrodos no períneo (externamente) ou no canal vaginal;
  3. Eletroestimulação Parassacral: estimulação direta nos nervos sacrais por meio do Tens (transcutaneous eletriacal nerve stimulation), normalmente duas vezes na semana, em sessões de 20 minutos;
  4. Eletroestimulação do Nervo Tibial Posterior: estimulação no nervo tibial posterior, por meio do Tens (transcutaneous eletriacal nerve stimulation), normalmente duas vezes na semana, em sessões de 20 minutos;
  5. Biofeedback Manométrico e EMG: é um procedimento que utiliza uma sonda vaginal e/ou anal com intensa contração, que auxilia na identificação dos músculos a serem trabalhados, aumenta a percepção sensorial, e restabelece a coordenação e o controle motor voluntário, resultando numa melhora funcional e, consequentemente, dos sintomas;
  6. Dispositivos Intravaginais (Cones Vaginais): são cones de 5 cm, com cores e pesos diferentes (de 20 a 70 gramas), para estímulo sensorial e fortalecimento da musculatura vaginal. De uso seguro e simples, pode ser introduzido pela própria paciente em casa;

 

Terapia comportamental: associado à cinesioterapia, tem por objetivo ensinar o paciente a controlar a perda urinária e os episódios de urgência miccional;

Acompanhamento nutricional: alimentação e ingestão hídrica adequadas. Evitar frutas cítricas, que aumentam a urgência miccional, bem como bebidas alcoólicas, produtos cafeinados, e alimentos que provocam constipação intestinal;

Dispositivos externos: coletores apropriados, como fraldas, comadres, papagaio, sistema coletor de urina fechado.

 

Conclusão

Um programa adequado, individual e específico de exercícios é o ideal para prevenir, minimizar e tratar os sintomas do trato urinário, visando a melhora da qualidade de vida do paciente e de suas atividades da vida diária.

Além disso, a fisioterapia pélvica e outros tratamentos não medicamentosos minimizam complicações secundárias e dificuldades decorrentes da mobilidade deficiente, não apresentam efeitos colaterais, não impedem o paciente de realizar outros tratamentos que possam vir a ser necessários.

Mais do que isso, sua associação com outras modalidades terapêuticas é muito benéfica.

 


 * A autora é fisioterapeuta, especialista em Terapia Intensiva e Respiratória e mestra em Ciências da Saúde pela Unifesp. Atualmente, é pesquisadora do Ambulatório de Imunologia, Alergia e Neurologia da Unifesp.

 

Referências

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